Aos familiares,
Aos admiradores
E ao povo de Santa Luzia.
O desfecho inelutável da vida
se apresentou ontem ao velho Manoel de Bia! Calou-se, definitivamente, a voz do
agricultor que fez da poesia força para superar a procela da vida sertaneja
assustada pelo fantasma da seca e da incerteza de quando viria o inverno bom!
Morreu Mané de Bia.
Mal-empregado eu não ter rimas
para oferecer uma última glosa ao poeta de nossa terra. Em verdade, é melhor
assim porque não haveria eu de submeter meu pobre e árido rimar ao magistral
reservatório de criatividade, ao sublime universo poético da criação de Manoel
de Bia. Sua devoção à poesia era séria, fiel e continha uma força de expressão
que só se entende no terreno do transcendental. Dizia ele, “com o coco eu
desafio o mundo”.
Desafiou e venceu, primeiro,
porque jamais lhe faltou rima e glosa para tratar das coisas do sertão, da vida
corriqueira do povo simples, do agricultor que debaixo deste sol causticante
depositava esperança nas sementes que enterrava, do heroísmo do vaqueiro que
busca a novilha desgarrada por meio dos galhos retorcidos e da jurema seca. Venceu, em segundo lugar,
porque a sua poesia e a sua disposição para o trabalho permitiram-no criar sua
prole honestamente, humildemente, honradamente. Seguiu um caminho na vida que,
os homens da mais elevada posição social, não teriam coragem hoje de, sequer,
começaria a trilhar.
A cultura de Santa Luzia
amanheceria esta quarta-feira mais pobre não fosse a possiblidade de manter
viva a memória, a lembrança e o sentimento de satisfação de ser conterrâneo de
Mané de Bia. A cultura de Santa Luzia não está empobrecida porque a passagem de
Mané de Bia não retira dos anais da história de nossa terra sua participação
marcante na vida cultural de nosso povo. Afinal, foi a voz do poeta e mestre
das artes que embalou os cocos de roda que animavam o São João de Santa Luzia.
Era o comando de sua voz, ao embalar os cocos, que transformava um formigueiro
humano em um imenso cordão a abraçar a praça de Santa Luzia irmanados todos e tecendo
a teia da cultura de Santa Luzia. As cantorias e baionadas, a tradicional quadrilha
de Dona Benta, a quadrilha dos vaqueiros e os fins de tarde do nosso São João
eram palco no qual brilhou esta estrela da constelação santa-luziense.
A morte de Manoel de Bia
traspassa o coração daqueles que admiram como se fosse flecha a querer romper
um elo criado e amarrado nas suas rimas.
A sua despedida deste mundo, pertence a um tempo e a um desígnio que não
é o nosso. Fosse assim, tenderíamos nós, os que o admiramos, a querer prorroga-la
para ter no nosso convívio a figura humilde no modo de ser, mas imponente no
modo de criar sua poesia. Definitivamente, se sua morte representa o fim de uma
existência física e da sua presença em nosso meio, sua passagem não empobrece a
nossa cultura se a sua obra for mantida viva na memória e nos corações daqueles
que souberam reconhecê-lo e admirá-lo aos quais se incumbe o dever de passar às
novas gerações o legado de Manoel de Bia. Em sua morte, uma voz que silencia
para viver eternamente na memória e no coração da cultura de Santa Luzia.
Descanse em paz, grande poeta.
Santa Luzia, 12 de novembro de 2014. José Aderivaldo.
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